quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Gravata

...
Então sai atrasado
E estava chovendo
Aquele barulhinho que parece cantar em meus ouvidos
Sexta-feira
Tem tudo pra ser um dia bom
Então coloquei meus papéis dentro de uma super-mala de couro
E sai andando
Os primeiros pingos de gota são os que a gente mais sente
Quando tocam nossa pele e escorrem em nosso corpo
O deixando com uma maravilhosa sensação gelada
Ai que vontade
Deu-me vontade
Mas não sei do que!
Que confusão
Andava lentamente sentindo as gotas mais do que alguém já sentiu
E tentando lembrar do que tinha vontade
De repente vi uma poça de água
AHHHHHH
Peguei meu guarda-chuva e abri
Não para me guardar
Pulei na poça
E comecei a rir como um tolo
Mas um tolo feliz
Ocorreu-me um pensamento:
Quando estamos felizes pq. importa as tolices que fazemos?
E me ocorreu uma conclusão:
Não importa.
Se eu não dar valor não importa
Dei uma grande gargalhada
Daquelas que dava quando era criança e minha mãe me mandava ficar quieto
Daquelas que dei quando ela se apaixonou por mim
Mesmo não ouvindo, prestou atenção em meus lábios.
Ah
Aquela moça de cabelos soltos
HAHAHAHAHAHA...
Empurrei meus montes de fios de cabelo molhados para trás grudando-os em minha testa
E já estava em casa
Prédio velho
Mas não me importo, gosto de coisas velhas e antigas.
Só não de moças assim!
(gargalhada)
Subi de escada
EU ADVIRTO: Subir de escada garante um exercício diário que muitos não fazem
Mas tem que subir ritmado e de coluna reta.
Batuquei os pés no corredor
E fiz uma mancha na parede com o pé
Então parei
Peguei minhas chaves
Entrei em minha casa
Andei até meu quarto
E encontrei a moça linda
Ela tinha acabado de tomar banho e estava com os cabelos despenteados
Em uma roupa confortável
Como pode ser linda em vestes tão simples?
Fui beijá-la
Ta eu sei que é deselegante abraça-la encharcado
Mas você não pensa em quanto era minha vontade?
Que aquilo não importa tanto naquele momento?
No dia em que me dei conta que as coisas não importam tanto?
Ela nem se importava também
Apertou-me com tanta vontade que me deu vontade de gargalhar
Mas meus beiços estavam ocupados
Em um beijo deslumbrante,
Que pena não ter platéia para ver tal espetáculo!
No fim do beijo
Deslizou sua boca em meu pescoço
E parou
Alguns passos para trás
E ela me encarou seria
Assustei-me com tal comportamento
Então apontou para minha gravata
Opa
O que é isso?
Fui ao espelho e lá estava
Um grande borrado
Ela passou a mão
E uma pasta vermelha grudou em seus dedos
Então me desesperei
Tentei explicar pq. sai atrasado
E pq. cheguei mais atrasado do que sai
Mas esqueci que ela não ouve
E como lhe explicaria?
Não me diga para escrever, a situação não espera!
Não dá tempo de procurar um papel!
Então me dei conta que mesmo que ela pudesse ouvir, a raiva a impediria de ME ouvir
Então me ocorreu um pensamento:
Pq. não damos valor até nos vermos em uma situação extrema e meu amor escorrer em forma de desespero?
Ela não tinha audição para ouvir
Nem voz para dizer
Mas nessa hora entendi tudo pelos seus olhos tristes de jabuticaba
Aqueles olhares conversaram comigo
Deram-me uma verdadeira lição de moral
E depois
Quando já não sobrava muita coisa de mim
Aquele olhar me esfaqueou
Senti a lâmina quente dentro de mim
Encostou-se a meu cérebro
Uma incrível onda de paralisia atacou meu sistema neural
Meu sistema linfático
E já não podia me defender
Desceu pela garganta
Me calando de vez
Parou meu coração
Meu estômago petrificou
E meus pés esticaram.
Faleci
E no dia que faleci aprendi quais eram as coisas que não importavam
Demorei uma vida pra aprender isso
Mas só em um milésimo de segundo antes de fechar meus olhos Me dei conta das coisas que realmente importavam.

...il propage ses ideias...

2 comentários:

luuu disse...

É, vou confessar que vai parecer um exagero da minha humilde parte..mas por um instante lí um pedaço de algum livro de Gabriel Garcia Márquez.



Já dizia ele:
"A vida não é a que gente viveu, e sim a que a gente recorda, e como recorda para contá-la"

Sah disse...

=)
acho q captei a mensagem dele